sábado, 26 de dezembro de 2009

Felizes

Com licença do meu amigo MS que me enviou este poema e como homenagem a todos os meninos... que sabem conservar-se meninos...



Num meio-dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu era tudo falso, tudo em desacordo Com flores e árvores e pedras.

No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem E subir para a cruz, e
estar sempre a morrer Com uma coroa toda à roda de espinhos E os pés
espetados por um prego com cabeça, E até com um trapo à roda da
cintura Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas
Um velho chamado José, que era carpinteiro, E que não era pai dele; E
o outro pai era uma pomba estúpida, A única pomba feia do mundo Porque
não era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.

Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe, E nunca tivera pai para amar
com respeito, Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz E deixou-o pregado
na cruz que há no céu E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o sol
E desceu pelo primeiro raio que apanhou.

Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas pelas estradas Que vão em ranchos pela
estradas com as bilhas às cabeças E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as cousas.
Aponta-me todas as cousas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando a gente as tem na mão E
olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente, Sempre a escarrar no chão E
a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -
"Se é que ele as criou, do que duvido" - "Ele diz, por exemplo, que os
seres cantam a sua glória, Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres."
E depois, cansados de dizer mal de Deus, O Menino Jesus adormece nos
meus braços e eu levo-o ao colo para casa.


VIII - Num Meio-Dia de Fim de Primavera
FERNANDO PESSOA

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Mais uma partilha

Com um agradecimento à minha amiga AM que me enviou a ligação para mais esta inspiradora conferência. E votos de umas boas festas e de um novo ano de paz.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Há que tempos não ponho nada aqui...




Uma vantagem, para além do sol e do calor, é que o tempo, nos lugares por onde ando, estica muito... Dá para vermos coisas que há muito esperam para serem vistas e... para as partilharmos com quem ainda não se tenha esquecido de aparecer por aqui.